Bons Dias | Machado de Assis

Bons Dias | Machado de Assis

Bons Dias | Machado de AssisTítulo: Bons Dias
Autor: Machado de Assis
Gênero: Romance
Categoria: literatura Brasileira
Arquivo: PDF
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Hão de reconhecer que sou bem criado. Podia entrar aqui, chapéu à banda, e ir logo dizendo o que me parecesse; depois ia-me embora, para voltar na outra semana. Mas, não senhor; chego à porta, e o meu primeiro cuidado é dar-lhe os bons dias. Agora, se o leitor não me disser a mesma cousa, em resposta, é porque é um grande malcriado, um grosseirão de borla e capelo; ficando, todavia, entendido que há leitor e leitor, e que eu, explicando-me com tão nobre franqueza, não me refiro ao leitor, que está agora com este papel na mão, mas ao seu vizinho. Ora bem!

Feito esse cumprimento, que não é do estilo, mas é honesto declaro que não apresento programa. Depois de um recente discurso proferido no Beethoven, acho perigoso que uma pessoa diga claramente o que é que vai fazer; o melhor é lazer calado. Nisto pareço-me com o principie (sempre é bom parecer-se a gente com príncipes, em alguma cousa, dá certa dignidade, e faz lembrar um sujeito muito alto e louro parecidíssimo com o imperador, que há cerca de trinta anos ia a todas as festas da Capela Imperial, pour étonner de bourgeois; os fiéis levavam a olhar para um e para outro, e a compará-los, admirados, e ele teso, grave, movendo a cabeça à maneira de Sua Majestade. São gostos de Bismark. O príncipe de Bismark tem feito tudo sem programa público; a única orelha que o ouviu, foi a do finado imperador, - e talvez só a direita, com ordem de o não repetir à esquerda. O parlamento e o país viram só o resto.

Deus fez programa, é verdade ("E Deus disse: Façamos o homem, à nossa imagem e semelhança, para que presida" etc. Gênesis, I, 26): mas é preciso ler esse programa com muita cautela. Rigorosamente, era um modo de persuadir ao homem a alta linhagem de seu nariz. Sem aquele texto, nunca o homem atribuiria ao Criador, nem a sua gaforinha, nem a sua fraude. É certo que a fraude, e, a rigor. a gaforinha são obras do diabo, segundo as melhores interpretações; mas não é menos certo que essa opinião é só dos homens bons; os maus creem-se filhos do céu - tudo por causa do versículo da Escritura.

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