A Miopia Histórica e o Autoritarismo Gradual: A Democracia em Risco

A Miopia Histórica e o Autoritarismo Gradual

Nos momentos decisivos da história, é comum que a maioria das pessoas não perceba a real magnitude dos acontecimentos até que se passe algum tempo. Esse fenômeno, conhecido como "miopia histórica", faz com que eventos relevantes, que moldam o futuro de uma sociedade, não sejam imediatamente reconhecidos. Só após décadas, ao olharmos para trás, é que compreendemos a importância e as consequências de certas decisões políticas e sociais. No entanto, em meio à cegueira histórica da maioria, alguns indivíduos visionários, com capacidade de analisar o presente com profundidade, conseguem perceber o impacto dessas mudanças no exato momento em que ocorrem.

A falta de percepção da importância do momento histórico pode ser utilizada de forma perigosa por líderes políticos. Governos com tendências autoritárias muitas vezes exploram essa miopia coletiva para avançar agendas que minam os fundamentos democráticos, implantando medidas autoritárias aos poucos. Esse processo é chamado de "autocratização gradual" ou "autoritarismo a conta-gotas". Em vez de uma tomada de poder abrupta, como um golpe militar, os regimes modernos tendem a consolidar o controle do estado por meio de mudanças pequenas e aparentemente inofensivas, dificultando a percepção imediata de que algo está errado.

O Caso da Venezuela: A Autocratização por Etapas

A Venezuela serve como um exemplo clássico de como o autoritarismo pode ser implantado de forma gradual. O governo de Hugo Chávez, seguido por Nicolás Maduro, implementou uma série de medidas ao longo dos anos que enfraqueceram progressivamente as instituições democráticas. A concentração de poder no executivo, o enfraquecimento do legislativo, a manipulação do judiciário e o controle sobre a mídia criaram um cenário no qual a oposição foi silenciada e os direitos individuais, restringidos.

Aos olhos de muitos venezuelanos, o processo aconteceu de forma tão sutil que, quando finalmente perceberam a extensão do controle estatal, já era tarde demais. O resultado foi a consolidação de um regime autoritário que transformou um dos países mais prósperos da América Latina em uma nação mergulhada em crise econômica e social.

O Perigo da Erosão Democrática no Brasil

O que muitos observam hoje é que o Brasil, de maneira preocupante, parece seguir uma trajetória semelhante à da Venezuela. A erosão das instituições democráticas ocorre lentamente, com medidas justificadas como necessárias diante de crises econômicas, políticas ou de segurança pública. No entanto, cada nova "solução" pode representar mais um passo na direção do autoritarismo.

"Reformas legais" que enfraquecem o sistema de freios e contrapesos, tentativas de controlar a soociedade atraés de meios "legais", o ataque à independência dos meios de comunicação e a intimidação da oposição são sinais de alerta para qualquer democracia. O perigo está no fato de que, como na Venezuela, essas ações podem ser vistas como pontuais ou de caráter emergencial, mas, no longo prazo, formam um padrão de concentração de poder.

O Papel da Imprensa e a Miopia Coletiva

A imprensa livre é, historicamente, uma das principais defensoras da democracia. No entanto, quando a mídia apoia ou se omite em relação a medidas que enfraquecem as instituições, ela perde seu papel fundamental de fiscalização do poder. Líderes autoritários, por sua vez, se aproveitam dessa complacência para implementar suas agendas com menor resistência.

No Brasil, muitos questionam se determinados veículos de mídia não estariam se alinhando a interesses políticos ou econômicos, ignorando seu papel como defensores da verdade e do interesse público. Esse alinhamento pode ocorrer por meio de incentivos financeiros, pressões políticas ou até por afinidade ideológica. Quando a imprensa abdica de seu dever de criticar e questionar, os cidadãos perdem uma ferramenta vital para a manutenção da democracia.

O fenômeno de "naturalização do autoritarismo" ocorre quando medidas autoritárias passam a ser vistas como normais ou inevitáveis. Em alguns casos, a própria imprensa contribui para isso, defendendo ou minimizando essas ações como soluções para crises imediatas, sem considerar os danos a longo prazo.

O Alerta para o Futuro

Se há algo que a história ensina é que a democracia é um sistema frágil que depende da vigilância constante da sociedade civil, da independência da imprensa e da integridade das instituições. A erosão democrática raramente acontece de maneira repentina; ela é quase sempre o resultado de um processo gradual que se torna evidente apenas quando já é tarde demais.

O caso da Venezuela deve servir de alerta para o Brasil e outros países que enfrentam crises internas. Medidas aparentemente inofensivas podem se acumular ao longo do tempo, levando ao enfraquecimento da democracia. A miopia histórica, que impede que a maioria perceba a gravidade dos acontecimentos no presente, é um risco real, e cabe aos cidadãos, às instituições e à imprensa manterem-se atentos e críticos para evitar que o autoritarismo se instale de maneira sorrateira.

A "miopia histórica" e a complacência da sociedade, somadas ao apoio ou à omissão da imprensa, podem ser usadas por líderes autoritários para consolidar o poder lentamente. Para que a democracia seja preservada, é essencial que os cidadãos mantenham a vigilância e exijam a fiscalização constante das ações do governo, garantindo que o equilíbrio entre os poderes seja mantido. A lição da Venezuela e de outros países que seguiram essa trajetória deve servir de aviso para que o Brasil não trilhe o mesmo caminho, e para que a democracia não seja desmantelada de forma imperceptível.

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