A Lanterna na Popa | Roberto Campos
"Juscelino deixou o país com aceleração inflacionária e uma grave crise cambial, conforme Lucas Lopes e eu havíamos profetizado. O sistema de 'inflação com sobrevalorização cambial' havia de muito sobrevivido à sua utilidade. E era incapaz de atender à tríplice tarefa de (a) sustentar a importação subvencionada dos produtos politicamente sensíveis; (b) financiar a industrialização acelerada; e (c) atender às reivindicações dos exportadores tradicionais. Mas tínhamos dado um salto industrial qualitativo e quantitativo, além do feito democrático de uma transição política normal. A inflação desenvolvimentista era um meio precário, mas factível, de acomodação das pressões contraditórias da antiga coalizão nacional-populista. Estava longe de ser uma experiência de 'desenvolvimento sustentável', para usar a linguagem dos modernos ecologistas...Houve uma correta percepção das vantagens do capital de risco, comparativamente ao endividamento, no fomento da indústria de transformação. As malsinadas multinacionais nos permitiriam um salto tecnológico e organizacional. Last but not least , houve uma racional divisão de tarefas entre a iniciativa governamental, centrada na provisão da infra-estrutura, e a iniciativa privada, que foi o motor principal do esforço de industrialização.
Juscelino havia criado o que se poderia chamar de ideologia 'futurível', transformando o desenvolvimentismo numa fonte de otimismo psicológico e legitimação política. Escapou assim ao 'nacionalismo complexado' da era Vargas e ao radicalismo marxista, alternativas certamente piores. E conseguiu temporariamente uma convergência entre os 'técnicos nacionalistas' (Furtado, Rômulo de Almeida) e os 'técnicos cosmopolitas' (Campos, Lucas Lopes) em torno do Plano de Metas. O divortium acquarum viria mais tarde, com o abandono, em 1959, do Programa de Estabilização e a ruptura com o FMI. Os cosmopolitas só voltariam a se tornar policy makers após a Revolução de 1964, quando prevaleceu a corrente neoliberal."
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