Literatura Anônima

O número de obras anônimas, aquelas cujo autor se desconhece, é considerável em todas as literaturas, especialmente as que procedem de tempos muito remotos. Isso se deve ao fato de terem as literaturas mais primitivas um caráter oral e pertencerem culturalmente a toda a comunidade, não se atribuindo importância, por conseguinte, à ideia de uma autoria individual.
Nas literaturas modernas, a partir do século XVI, o anonimato visa ao objetivo de não tornar conhecido o nome do autor, com a intenção deliberada de ocultar a origem da obra. O mesmo objetivo pode ser alcançado pela atribuição da obra a um autor de nome livremente inventado, o que é o caso do pseudônimo.
Um autor prefere o anonimato ou usa pseudônimo quando, principiante, ainda não tem coragem de se expor ao julgamento do público e da crítica, ou quando inicia nova tendência ou novo gênero, de cujo sucesso não está certo. Foi esse o caso de Waverley, publicado anonimamente por Sir Walter Scott, em 1814, como lançamento do gênero, então novo, do romance histórico.
Outro caso, mais frequente, de anonimato em literatura é a pressão da censura, da qual o autor espera medidas prejudiciais. Esse motivo de anonimato ocorre a partir da Reforma e da Contra-Reforma, no tempo das monarquias absolutas e até à época moderna.
Um dos primeiros e mais famosos casos de anonimato por medo de censura são as Epistolae obscurorum virorum (Cartas de homens obscuros), publicadas entre 1515 e 1517, para apoiar Johannes Reuchlin em sua luta contra os dominicanos de Colônia. O autor principal dessa sátira foi Crotus Rubianus, pseudônimo de Johannes Jaeger. Outro famoso caso análogo são as Letters of Junius (Cartas de Junius), que, publicadas entre 1769 e 1772 no jornal londrino The Public Advertiser, atacavam fortemente as tendências absolutistas do rei Jorge III. Tais cartas são uma obra-prima de jornalismo político e um monumento da prosa inglesa em sua fase classicista, do século XVIII.
Anonimato na literatura espanhola. Caso especial é o da literatura espanhola: são anônimas justamente algumas de suas obras mais importantes ou características, isto é, obras em que se manifestam com força invulgar certos traços específicos da mentalidade espanhola, como a frugalidade imposta pela miséria econômica, a paixão religiosa ou a resignação melancólico-estoica.
Famosa obra anônima é o Lazarillo de Tormes, primeiro exemplo de romance picaresco, caracterizado por Benedetto Croce como espécie de epopeia da fome. O soneto "A Cristo crucificado", datado de 1628, já foi atribuído a santa Teresa e a outros santos, mas seu autor mais provável é o monge agostiniano Miguel de Guevara, que morreu no México em 1640. Já a Epístola moral a Fábio, grande elegia sobre o desengano da vida, foi creditada a um "anônimo sevilhano do século XVI". Mas tal hipótese foi depois rejeitada, por ser inconfundível o espírito contra-reformista dos versos. A obra foi a seguir atribuída a Francisco de Rioja y Rodríguez, Francisco de Medrano, Rodrigo Caro e outros, porém a autoria mais provável é a do capitão Andrés Fernández de Andrada, de quem, aliás, pouco se sabe.
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