Ficção Científica (Gênero Literário)

Ficção Científica (Gênero Literário)

Ficção Científica (Gênero Literário)

Gênero literário que se desenvolveu no século XX e espraiou-se para outras formas de manifestação artística, principalmente para o cinema, a ficção científica tem como tema principal a reflexão sobre as descobertas da ciência e a evolução tecnológica. Literatura característica de uma época de transição, em que a fé cega nos enunciados científicos e no progresso tecnológico, vigentes no século XIX, deram lugar à desconfiança e ao temor, a ficção científica traduz uma mudança geral de mentalidade em relação à ciência. No entanto, a atitude da ficção científica nem sempre é crítica: tanto pode adotar o culto cientificista e otimista, como uma posição de pessimismo e anticientificismo.

As conquistas da ciência e da tecnologia, suas possibilidades sem limites e suas experiências às vezes temerárias constituem a matéria-prima da ficção científica.

A ficção científica funda-se sobre o possível e nisso difere da literatura fantástica, que se baseia numa impossibilidade real. Por isso, os precursores do gênero, como o Frankenstein (1818), de Mary Shelley, e o Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde (1886; O médico e o monstro), de Robert Louis Stevenson, são ficção científica; enquanto o Dracula (1897), de Bram Stoker, não pertence a esse gênero, mas à literatura fantástica. Ao mesmo tempo, a ficção científica também se distancia da ciência, pois esta tem como projeto principal descrever a realidade, enquanto a literatura procura desenvolver os conflitos entre as exigências do homem e os limites impostos pelo mundo exterior. Como busca na ciência os meios para tornar-se convincente aos olhos do leitor, a ficção científica torna-se uma literatura conjectural, do "pode ser". Quando esse "pode ser" se torna uma ameaça à sobrevivência da humanidade, a ficção científica assume o papel de crítica social, tanto mais evidente quanto mais se aproxima o futuro previsto pelos futurologistas da ciência.

AntecedentesMuitos citam como antecessores da ficção científica Ariosto, Kepler, Cyrano de Bergerac, Voltaire, Swift e outros autores de utopias ou de relatos de viagens fantásticas, que de uma forma ou de outra utilizaram temas depois explorados pela ficção científica. Uma análise rigorosa mostra, porém, que a semelhança é ilusória. Na maioria dos casos, essas utopias ou viagens são alegóricas, filosóficas ou satíricas e têm endereço em seu próprio tempo, desde a Utopia de Thomas More ao Micromégas de Voltaire. As ficções do Iluminismo são meras transposições da realidade com objetivo crítico.

O mesmo se deve dizer da ficção utópico-fantástica do século XIX e princípio do século XX, em autores como Lamartine, em La Chute d'un ange (1838; A queda de um anjo), Balzac, Edgar Allan Poe, Edward Bellamy, Samuel Butler, Mark Twain e, no século XX, Karel Capek, Ievgeni I. Zamiatin, George Orwell e Hermann Hesse. Kingsley Amis chamou a atenção para The Tempest (A tempestade), de Shakespeare, como espécie de ficção científica antecipada. Ape and Essence (1949; O macaco e a essência), de Aldous Huxley, é também pura ficção científica, mas na verdade, como as obras dos autores referidos, não foi concebido nesse contexto. Já C. S. Lewis, conquanto tenha feito uma ficção de fundo religioso-doutrinário, inscreveu-se deliberadamente no campo da ficção científica e foi aceito como tal. Para alguns, ele é autor do melhor romance de ficção científica, Out of the Silent Planet (1938; Além do planeta silencioso).

Precursores da ficção científicaAutênticos precursores foram Júlio Verne, H. G. Wells e Olaf Stapledon. O primeiro escreveu uma ficção didática, com a modesta intenção de contribuir para a difusão de conhecimentos científicos, mas revelou-se narrador fascinante e espírito profético. Suas antecipações técnicas se realizaram com precisão espantosa, considerados os poucos elementos de que dispunha.

As antecipações de H. G. Wells não são menos ambiciosas que as de Verne: Wells acreditava-se profeta, mas, embora não tenha sido feliz nas profecias, quase toda sua obra continua viva. Ao morrer, em 1946, tinha visto toda uma literatura surgir na esteira de algumas de suas obras.

Olaf Stapledon, da mesma forma, não teve êxito em suas profecias, mas nesse caso as extrapolações históricas eram de cunho filosófico e não tecnológico. Last and First Men (1930; Os últimos e os primeiros homens) encerra quase todas as hipóteses temporais e biológicas exploradas pela ficção científica, apesar de Stapledon não utilizar máquinas. Em 1937, com Star Maker (O criador de estrelas), tentou um projeto ainda mais ambicioso: a história do universo.

Há, por fim, outro nome de grande importância no desenvolvimento da ficção científica, também autor de literatura fantástica. Trata-se de Howard Philips Lovecraft, autor de admiráveis histórias de horror e do sobrenatural, criador de mitos macabros e arquétipos obsessivos. Sua influência literária foi considerável, embora restrita a um pequeno círculo, do qual viriam a destacar-se Robert Bloch e Henry Kuttner. Em mais de um sentido, é um simbolista, com sua prosa suntuosa, de rasgos barrocos.
A grande geração da ficção científica. Justamente em 1937, ano em que morreu H. P. Lovecraft, tomou impulso a segunda geração da ficção científica americana, chamada "grande geração": apareceram Eric Frank Russel e L. Sprague De Camp. No ano seguinte, tornaram-se conhecidos Lester del Rey, Arthur C. Clarke e Ray Bradbury e, em 1939, Alfred Elton Van Vogt, Robert Heinlein, Theodore Sturgeon, Isaac Asimov e Fritz Leiber. Foram esses escritores que construíram o que hoje se entende por ficção científica. Deixando de lado a parafernália tecnológica, é uma literatura que recolhe o otimismo dos americanos e suas incertezas econômicas e políticas, num mundo às vésperas da segunda guerra mundial.

Durante a guerra e depois dela, o gênero cresceu ainda mais. Seu novo e palpitante assunto, a bomba atômica, deixara de ser uma ficção. Surgiu o pânico nuclear, o perigo das mutações provocadas pelas radiações e a guerra fria. A ficção científica do pós-guerra se debruça exaustivamente sobre esses problemas. Entre 1949 e 1953, surgiu um sem-número de revistas especializadas. Novos temas e novas conjecturas foram propostos: além da química, da física nuclear, da biologia, da arqueologia, da eletrônica e da astronáutica, cuida-se de história, de psicologia, de religião e de sexo. A parapsicologia aparece com frequência. Já se falava numa space opera parapsicológica: seres humanos dotados de poderes supranormais. A ficção científica se transmitiu às artes plásticas, à arquitetura, à engenharia e à moda.

Ray Bradbury foi o nome que mais solidamente se firmou e o primeiro a obter reconhecimento literário junto à crítica. Sua ficção é ambivalente, mais fantasiosa do que científica, e lhe granjeia prestígio como contista. Em 1952, Clifford D. Simak reuniu em livro os contos de City (Cidade), um dos clássicos do gênero. More Than Human (Mais que humano), de Theodore Sturgeon, é de 1953. Desse mesmo ano é Fahrenheit 451, de Bradbury.

Novos ficcionistasA terceira e a quarta gerações de autores de ficção científica, qualitativamente e em conjunto superiores às primeiras e mais diversificadas quanto à temática, reúnem Philip José Farmer, que abordou a temática sexual; Edmund Cooper; William Tenn; Brian Wilson Aldiss; James Bliss, com A Case of Conscience (1958; Um caso de consciência); Frederik Pohl; Walter M. Miller Jr., com a ficção científica religiosa de A Canticle for Leibowitz (1960; Cântico para Leibowitz); Avram Davidson; Judith Merril; o contista Robert Sheckley; Algis Budrys; J. G. Ballard e, especialmente, Roger Zellazny. Kurt Vonnegut Jr., escritor que também abraça outros gêneros, adquiriu popularidade junto ao público jovem. Em Sirens of Titan (1959; Sereias do Titã) e Mother Night (1961; A mãe noite), ele revela sua preocupação com as perspectivas de um conflito global.

Fora dos Estados Unidos e do Reino Unido, onde a língua comum permitiu o intercâmbio quase imediato, a ficção científica desenvolveu-se somente entre franceses e russos. Merece citação também o polonês Stanislav Lem, autor de Solaris.

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