Papado na Igreja Católica Apostólica Romana

 Papado na Igreja Católica Apostólica Romana

Papado

Sistema de governo central da Igreja Católica Apostólica Romana, presidido pelo bispo de Roma, o papado abrange uma longa e ininterrupta série de papas. O sistema sempre foi alvo de disputas ao longo dos séculos, e a complexidade do sistema pode ser avaliada pela multiplicidade dos títulos do papa: bispo de Roma, vigário de Jesus Cristo, sucessor do príncipe dos Apóstolos, pontifex maximus da igreja universal, patriarca do Ocidente, primaz da Itália, arcebispo da província de Roma, soberano do estado do Vaticano e servo dos servos de Deus.


Ponto crucial na divergência entre os três ramos do cristianismo -o católico, o ortodoxo e o protestante -, o papado é uma instituição fundamental na Igreja Católica. Esta considera o bispo de Roma o sucessor de Pedro e a suprema autoridade em relação a toda a igreja.


Justificação teológica. Segundo os teólogos católicos, para que a igreja se mantivesse até o fim dos tempos, Jesus Cristo confiou poderes - sacramentais, doutrinais e administrativos - aos doze apóstolos e, em particular, a Pedro. Tais poderes foram herdados pelo colégio episcopal universal -- reunido em concílio ou mediante o magistério comum -- e pelo bispo de Roma, individualmente.


Poderes dos "doze". A expressão "doze apóstolos" é usada no Novo Testamento para indicar aqueles escolhidos por Jesus como colaboradores mais imediatos. Refere-se à organização da nova cidade de Deus - a igreja -, como continuação transformadora das doze tribos de Israel, portador das promessas de Iavé. O número simbólico dos doze foi rompido com a traição de Judas e recomposto imediatamente com a eleição de Matias. Acrescentou-se a eles o apóstolo Paulo, chamado diretamente numa aparição de Cristo ressuscitado, o qual adquiriu o mesmo ou até maior prestígio que os outros apóstolos pelo êxito de sua prédica entre os gentios.


"Os doze" difundiram o Evangelho - a boa nova -, fundaram e organizaram igrejas locais, estabeleceram supervisores (bispos) e dirimiram seus problemas doutrinais mediante cartas, emissários ou visitas pessoais. Em certa ocasião, quando todos estavam reunidos com a comunidade de Jerusalém para resolver um problema crucial, o do ingresso dos gentios no povo de Deus sem submeter-se à circuncisão ou à lei de Moisés, Paulo conseguiu impor essa tese, ao que parece contra a proposta de Tiago e apesar das dúvidas de Pedro.


Poderes de Pedro. Simão Pedro desempenhou um papel principal entre os apóstolos. Apesar de suas fragilidades humanas, Cristo chamou-o "pedra" (Cefas, Pedro), porque sobre ela edificaria sua igreja, e lhe conferiu as chaves do reino dos céus (Mateus 16:18-19). Novamente, depois das três negações, encomendou-lhe pessoalmente o cuidado de seus "cordeiros" e de suas "ovelhas" (João 21, 15-17). Ainda que os críticos não sejam unânimes quanto a essas passagens, a primazia de Pedro é reconhecida ainda hoje por orientais, luteranos, calvinistas e anglicanos. Nem João, "o discípulo amado", nem o impetuoso Paulo privaram-no de sua reconhecida autoridade.


A sucessão apostólica. No que se refere à sucessão dos apóstolos, a maioria dos cristãos admite que os bispos herdaram os poderes dos apóstolos para a manutenção -- doutrinal e administrativa -- da igreja, ainda que não tenham herdado os poderes institucionais próprios da igreja em estado nascente. No entanto, não faltam discórdias sobre o poder atribuído aos bispos, aos presbíteros ou à assembléia de fiéis (episcopais, presbiterianos, congregacionistas). Em todo caso, estes poderes são somente para manter a fé, para prolongar e continuar a obra de Cristo, não para inovar e nem para paralisar a fé, mas para adaptá-la às mutáveis circunstâncias culturais.


Mais discutida tem sido a sucessão de Pedro por meio dos bispos de Roma, que constitui a principal justificativa do papado -- teoria petrina. Alguns negam a estada e morte de Pedro em Roma, apesar das provas arqueológicas apresentadas pelos católicos.


A infalibilidade do papa. Análise especial requer o tema da infalibilidade do papa, isto é, o da impossibilidade de equivocar-se ao definir um tema referente à fé ou à moral. Na Idade Moderna, o Concílio Vaticano I, em 1870, reforçou a supremacia papal, acima da qual não existe nenhum poder superior, nem mesmo o concílio. A noção de que a igreja, como comunidade dos fiéis, é infalível, jamais foi questionada em sua antiguidade e canonicidade, nem mesmo pelos protestantes. Mas a transferência dessa infalibilidade para o papa -- conceito teológico moderno característico da corrente ultramontanista, que tomou vulto nos séculos XVI e XVII -- suscitou polêmicas e jamais foi aceita por alguns setores do cristianismo, como os ortodoxos orientais e os protestantes. Se o tema da infalibilidade é em si mesmo difícil e polêmico, freqüentes mal-entendidos agravaram ainda mais essa característica. A infalibilidade do papa refere-se somente aos momentos solenes nos quais o pontífice romano fala ex cathedra, ou seja, do trono pontifício, para definir algo referente à fé ou aos costumes, como implícita na fé da igreja.


Ainda que essa definição seja proclamada pela própria autoridade do papa (ex sese), ele a formula, no entanto, em comunhão com todos os bispos do mundo. A infalibilidade reside no papa, mas também, como voltou a enfatizar o Vaticano II, entre 1962 e 1965, em todo o colégio episcopal, que inclui necessariamente o papa. Dentro de um raciocínio lógico, se um desses dois elementos, o papa, já inclui a infalibilidade, o outro, os bispos, nada acrescentaria. Todavia, para os católicos, não acontece assim. A infalibilidade não se encontra no papa nem nos bispos; está na igreja, brota de Cristo e do Espírito Santo, que estão presentes e se manifestam no papa e nos bispos.

História do papado

História do papado. Primeiro milênio. Até o século IV, inclusive, não aparece entre os papas nenhuma personalidade importante; Clemente I, quarto bispo de Roma, é lembrado como autor de uma epístola que frisa o conceito hierárquico da igreja; e o nome de Calisto I distingue a catacumba na Via Appia, fora dos muros de Roma e ainda a mais visitada, onde ele e outros dos primeiros papas estão sepultados. Esses primeiros bispos de Roma tiveram de lutar, constantemente, contra gnósticos e outros heréticos, fundando a fama de sua sé como cidadela de ortodoxia inflexível, mas só Vítor I chegou ocasionalmente a desempenhar papel de liderança nas lutas dentro da igreja. A transferência da capital para Bizâncio parece ter enfraquecido o prestígio dos bispos de Roma: Libério e Dâmaso I são apenas notáveis bispos de província.


O verdadeiro fundador do poder papal foi Leão I Magno, cuja intervenção no Concílio de Calcedônia e na condenação do monofisismo foi decisiva; também conseguiu proteger a Itália contra a invasão de Átila e dos hunos, o primeiro grande feito político do papado. Depois continuou a luta contra o monofisismo e os imperadores bizantinos que procuravam entendimento com esses heréticos. Enfim, os imperadores perdem a Itália para os lombardos, novo perigo para o papado.


Foi nesse clima difícil que surgiu Gregório I Magno, o primeiro papa medieval, nobre romano que adotou o título de "servo dos servos de Deus", fundador da igreja na Inglaterra e sistematizador do canto "gregoriano". A conversão dos povos bárbaros e a proteção que os papas tiveram que buscar neles, propiciaram um reconhecimento mútuo e um amálgama entre o político e o religioso, no qual cada uma das partes procurou absorver e subordinar a outra. Ao consolidar o "patrimônio de Pedro" (terras controladas pelo papado), são Gregório Magno tornou-se, inadvertidamente, o fundador dos futuros Estados Pontifícios e do poder político e militar dos papas.


Nenhum dos sucessores de Gregório Magno teve sua firmeza. Honório I teria chegado a ceder à heresia do monoteletismo, o que no século XIX foi explorado para combater o dogma da infalibilidade. Os arcebispos de Ravenna, apoiados pelos lombardos, abriram um cisma que ameaçou a unidade da igreja. Enfim, os papas Zacarias e Adriano I procuraram a ajuda dos francos e da dinastia carolíngia, e a coroação de Carlos Magno, no ano 800, pelo papa Leão III iniciou a ligação do papado com o império restaurado ao norte dos Alpes. O enfraquecimento da dinastia carolíngia, depois da morte de Carlos Magno, favoreceu, por um instante, a independência política do papado: Nicolau I arrisca o cisma, excomungando Bizâncio, para garantir seu primado na igreja do Ocidente, à qual pretendeu incorporar as nações eslavas, recém-convertidas, mas sua iniciativa não foi bem-sucedida.


Combatido por Bizâncio e abandonado pelos francos, o papado caiu nas mãos da aristocracia feudal dos arredores de Roma. Era uma aristocracia bárbara, que se serviu de bandos armados e da influência de mulheres duvidosas para apoderar-se do bispado romano e aproveitar as vantagens da devoção dos povos semibárbaros da Itália e ao norte dos Alpes. O século X foi o período mais triste da história do papado. João XII lidera uma corte dominada por concubinas e bandidos; nasceu nessa época a lenda da "papisa" Joana. Pouco adiantaram as tentativas de intervenção dos imperadores alemães para conseguir a eleição de papas dignos. Só Silvestre II é uma figura notável: grande erudito, foi supersticiosamente considerado como feiticeiro.


Da questão das investiduras ao Renascimento. No século XI, o imperador Henrique III conseguiu restabelecer a ordem em Roma, à custa de tornar o papa dependente do poder temporal. Leão IX iniciou, com a ajuda dos monges de Cluny, a reforma moral da igreja; em compensação, perdeu definitivamente o Oriente, pelo cisma de 1054. A reforma começou com a proibição estrita da simonia e com a imposição do celibato: liberando o clero das influências do dinheiro e dos laços familiares, a igreja de Roma voltou a tornar-se independente. Afirmou essa independência também fora da Itália, exigindo o direito exclusivo da investidura dos bispos; mas estes, na Alemanha, eram príncipes feudais e a base do poder imperial. O grande papa Gregório VII tirou as últimas conseqüências da situação: pretendeu reunir, em sua pessoa, o poder espiritual e o temporal. Teve a satisfação de, em Canossa, impor sua vontade ao imperador Henrique IV; mas perdeu a guerra e morreu no exílio.


Pela primeira cruzada, Urbano II assumiu a liderança espiritual do continente; e pela concordata de Worms (1122) a questão da investidura dos bispos foi resolvida a contento. Contudo, os papas continuaram a defender a superioridade do poder espiritual sobre o temporal, enquanto as lutas de Alexandre III com Frederico Barba-Roxa dilaceravam a Itália. Por um momento, a igreja pareceu vencedora. O papa Inocêncio III foi reconhecido como detentor do poder supremo na Europa. Seu sucessor, Honório III, recebeu ajuda das novas ordens -- franciscanos, dominicanos, carmelitas -- para manter o poder. Em Frederico II, de Staufen, talvez o maior monarca da Idade Média, surgiu, no entanto, um inimigo implacável das pretensões eclesiásticas. A luta de Gregório IX e Inocêncio IV destruiu, enfim, a dinastia dos Staufen e o poder imperial, mas enfraqueceu definitivamente o papado, que perdeu o poder político.


Avignon. No fim do século XIII, quando o papa Celestino V resolveu abdicar, já não parecia haver esperanças. Pela última vez, Bonifácio VIII renovou as exigências de supremo poder da Santa Sé, contra a ferrenha resistência do rei da França. Clemente V, cedendo aos franceses vitoriosos, resolve abandonar Roma e transferir o papado para Avignon, com todas as desastrosas conseqüências políticas e morais dessa mudança. Enfim, Urbano VI voltou para Roma, mas parte dos cardeais e da cúria não lhe deu apoio. Elegem-se dois papas, um em Roma e outro em Avignon, e iniciou-se o grande cisma do Ocidente. O cisma só em 1415 terminou, pelo Concílio de Constança, ao preço de submeter o papado ao poder superior de uma assembléia geral da igreja (Concílio da Basiléia).


O papado conseguiu livrar-se das limitações conciliares e voltar a ser poder absoluto pela ação de Nicolau V e Pio II, grandes humanistas e os primeiros papas do Renascimento. A reação anti-humanista de Paulo II não teve sucesso. O papado da segunda metade do século XV tornou-se um poderoso principado italiano, pretendendo liderar a política peninsular e acumulando em Roma os tesouros da arte profana. Daí sua contaminação pelo espírito do Renascimento secularizado, e Alexandre VI, membro da família Borgia, passa por ter sido o mais amoral de todos os papas; na verdade, era um grande estadista. Júlio II chega a ser notável cabo-de-guerra, conquistando grande parte do centro da península e consolidando as fronteiras dos Estados Pontifícios. Mas a italianização total do papado e a imposição de pesados tributos aos fiéis de toda a Europa foram as causas exteriores do grande movimento religioso que foi a Reforma.


Reforma e Contra-Reforma. Leão X foi um grande mecenas, pouco se preocupando com a tempestade desenfreada ao norte dos Alpes. Seu sucessor, Adriano VI, o último papa não italiano até 1978, entendeu melhor o perigo mas não teve tempo para a reação necessária. E Clemente VII voltou a ser príncipe profano, dedicado às artes, às letras e às intrigas políticas. Era inevitável o desastre: em 1527 Roma foi saqueada pelas tropas imperiais, e pouco depois a Inglaterra se separou da Santa Sé. O primeiro papa da Contra-Reforma foi Paulo III, que convocou o Concílio de Trento e autorizou a fundação da Companhia de Jesus. E Pio V foi o chefe austero da igreja agora totalmente redisciplinada.


Seus sucessores mais notáveis foram: Gregório XIII, lembrado como reformador do calendário; Sisto V, o melhor administrador que os Estados Pontifícios jamais tiveram; Clemente VIII, que mandou publicar a edição definitiva da Vulgata; Urbano VIII, que deve a fama ao infeliz processo contra Galileu, mas que merece melhor conceito como grande mecenas do barroco, que modificou totalmente o aspecto da cidade de Roma. O papado se achava firmemente nas mãos das grandes famílias italianas: Borghese, Farnese, Aldobrandini, Ludovisi, Barberini.


Desde a época de Trento, o papado tinha acompanhado a política da Espanha contra os protestantes. Mas o poder espanhol não foi derrotado pelos heréticos, e sim pela França, a verdadeira vencedora da paz de Vestfália (1648), em que os interesses do papado não foram levados em conta. A Santa Sé perdeu totalmente a influência política. De dependente de Madri transformou-se em dependente de Versalhes, tendo de aceitar a ajuda de Luís XIV contra a heresia jansenista e de tolerar o galicanismo do poder real da França. Por volta de 1700, o papado não passava de um poder espiritual, limitado aos países católicos reconquistados pelos jesuítas e dedicado à missão nas Américas e na Ásia.


Iluminismo e a restauração. Essa posição tornou-se ainda mais fraca, no século XVIII, diante dos ataques dos iluministas e da maçonaria. Os papas desistem mesmo de protestar. Bento XIV aceitou a dedicatória de uma peça de Voltaire, e Clemente XIV cedeu às pressões das cortes bourbônicas, dissolvendo a Companhia de Jesus. Pio VI não conseguiu defender a igreja contra as reformas anticlericais do josefinismo na Toscana e Áustria; humilhado pelos exércitos revolucionários franceses e desterrado, morreu no exílio.


Pio VII, ajudado pelo secretário de Estado, o cardeal Consalvi, depois de ter concluído com Napoleão a concordata de 1800, conseguiu no Congresso de Viena (1815) o restabelecimento dos Estados Pontifícios, em que Gregório XVI, inimigo ferrenho do liberalismo político e intelectual, chefiou uma administração caótica e intolerante. Mas não pareceu possível continuar essa intransigência, sobretudo quando o liberalismo se tornou nacionalista, exigindo a unificação política da Itália. Pio IX pareceu, por um momento, disposto a entender-se com os liberais. A vitória efêmera da revolução de 1848 em Roma converteu-o, no entanto, em inimigo implacável das forças novas. Pagou o preço de perder, em 1860 e em 1870, o poder temporal e a própria Roma, e enclausurou-se voluntariamente no Vaticano; mas restabeleceu, pelo Concílio Vaticano I (1870), a força defensiva da igreja. Seu grande sucessor, Leão XIII, também restabeleceu a autoridade moral da igreja, inclusive junto aos infiéis. Abrindo aos historiadores os arquivos do Vaticano, favorecendo paternalmente o movimento operário e reconciliando-se com a república na França, é considerado o primeiro papa moderno.


Século XX. Um novo período de intransigência foi iniciado por Pio X, que procurou sufocar o modernismo e se mostrou avesso a movimentos democráticos entre os católicos. No entanto, essa política só em parte foi mantida por Pio XI, que se reconciliou com a Itália, e por Pio XII. João XXIII convocou o Concílio Vaticano II, concluído por Paulo VI. O Vaticano II representou uma mudança significativa na orientação da igreja, pelo reconhecimento da colegialidade dos bispos, pela maior participação de todos os cristãos e pela renovação bíblica e litúrgica, que abriram novas esperanças no diálogo ecumênico. No entanto, a encíclica Humanae vitae, de Paulo VI (1968), sobre o controle da natalidade, foi considerada uma negação do colegiado dos bispos na tomada de decisões.


Essas críticas e a tensão provocada pelos termos com que o papa se pronunciou sobre o celibato eclesiástico abriram polêmica sobre o velho problema da autoridade ilimitada do papa. Com isso, alguns exegetas católicos reivindicaram que o decreto Sacrosanta, do Concílio de Constança (1415), recebesse validade dogmática permanente. Tal decreto validava a autoridade do concílio ecumênico como superior à do papa, em matérias pertinentes à fé, à eliminação do cisma e à reforma da igreja.


O pontificado de João Paulo II logo se notabilizou pelo programa de visitas a outros países, sobretudo aos de maioria cristã. A política externa do Vaticano visou principalmente o ecumenismo e o combate à "revolução silenciosa", configurada pela freqüência cada vez menor de fiéis nas igrejas e pela perda do poder institucional na hierarquia católica. No âmbito interno da igreja, o papa colocou como prioridade combater a "teologia da libertação".


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