Arcadismo, Definição e Começos da Arcádia

Arcadismo, Definição e Começos da Arcádia

#Arcadismo, Definição e Começos da ArcádiaA Arcádia, na Grécia Antiga, era a região do Peloponeso onde os pastores presumivelmente se dedicavam à dança, ao canto, à poesia bucólica. Por isso se deu esse nome, inicialmente, ao círculo de escritores e artistas que no fim do século XVII, em Roma, se reuniam no palácio da ex-rainha Cristina, da Suécia, que passou a viver ali depois de se converter ao catolicismo e abdicar ao trono. Apaixonada pela literatura, Cristina gostava de se cercar de críticos e poetas. Após sua morte, em 1689, seu salão transformou-se na academia denominada Arcádia, com 16 integrantes que assumiram novos nomes gregos e latinos, diziam-se "pastores", chamavam seu presidente de "guardião geral" e reuniam-se em jardins.

Característico da Europa do século XVIII em seu contexto iluminista e de revolução burguesa, o arcadismo buscou a expressão de um saber mais preciso e natural, tomando por modelo a antiguidade clássica. Originalmente italiano, passa à Espanha, a Portugal e ao Brasil da chamada escola mineira.

Do ponto de vista ideológico e estético, sua atitude era de reação ao barroco e ao conceptismo (na Itália, particularmente o marinismo) do século XVII, que a essa altura, decadentes, já se tinham tornado meras práticas de ostentação intelectual e social, na empolação e preciosismo de uma linguagem sem substância. Desse modo, para a Arcádia, era preciso restabelecer a perfeição e naturalidade do modelo clássico, sua clareza e bom gosto.

Esses primeiros árcades tomaram como padrão o romance pastoril Arcádia (1502), de Jacopo Sannazzaro, calcado no bucolismo do poeta grego Teócrito e do latino Virgílio. Outras fontes de inspiração, na Grécia, foram Píndaro e Anacreonte. Seus principais tratadistas teóricos, Ludovico Antonio Muratori e Gian Vincenzo Gravina, trataram de formular a filosofia do movimento, que, na relação com a natureza, já apresenta matizes pré-românticos.

Há também, em tudo isso, a influência do racionalismo iluminista e de um erotismo que é ao mesmo tempo de fundo anacreôntico e de dívida para com Giambattista Marino, como o único traço do barroco a ser mantido pela Arcádia (devendo-se acrescentar, no entanto, que já teria sido o único traço dos clássicos mantido pelo barroco, pelo menos na península italiana). O poeta que melhor realizou os ideais do grupo foi Pietro Metastasio, especialmente na tendência anacreôntica, de louvor do prazer e da vida material.

Arcadismo ibérico - O barroco, na Espanha, cedeu pouco terreno ao arcadismo, pois foi, na realidade, uma das vertentes mais férteis da poesia espanhola, mas é caracteristicamente arcádico o lirismo de Juan Meléndez Valdés. Em Portugal, o movimento teve maior repercussão: em 1756 Antônio Diniz da Cruz e Silva, Teotônio Gomes de Carvalho e Manuel Nicolas Esteves Negrão fundaram a Arcádia Lusitana ou Ulissiponense. Como na Itália, os integrantes adotaram criptônimos. Deram a sua sede o nome de Monte Ménalo.

O grupo teve como teórico Cândido Lusitano, pseudônimo do padre Francisco José Freire, filólogo, tradutor de Horácio e Racine. Em sua Arte poética reafirmou o compromisso do arcadismo com os princípios clássicos. No entanto, o nome mais representativo do movimento nessa fase foi o de Correia Garção, de influência nitidamente virgiliana em suas Obras poéticas. Outros autores que se podem lembrar são o fundador Cruz e Silva e Domingos dos Reis Quita.

De muito maior relevo, porém, foi a segunda fase do movimento em Portugal, a Nova Arcádia ou Academia de Belas-Letras de Lisboa, que em 1790 tomou o lugar da Arcádia Lusitana e passou a se reunir no salão do conde de Pombeiro, sob a direção do mulato Domingos Caldas Barbosa, autor da Viola de Lereno, repleta de ingredientes brasileiros. O poeta nascera no Rio de Janeiro e só aos 25 anos seguira para Lisboa, onde encontrou boa acolhida.

A seu lado, duas outras grandes figuras participaram do movimento, o neoclassicista convincente e patriota que foi Filinto Elísio (pseudônimo arcádico de Francisco Manuel do Nascimento) e sobretudo o rebelde e admirável poeta Manuel Maria du Bocage, pioneiramente moderno em seu conflito pré-romântico entre a vida e o horror da morte. Bocage é, na verdade, a figura mais expressiva do arcadismo em qualquer parte. Inclusive porque contém o seu avesso e anuncia o futuro.

No Brasil - O arcadismo, no Brasil, apareceu quase ao mesmo tempo que em Portugal, propiciado pelo ciclo do ouro e seu embrião de classe média urbana, letrada e inconfidente. Seus representantes estudaram com os jesuítas e quase todos em Coimbra. Há duas fases e atitudes distintas, a épica e neoclássica, representada pelas contribuições de Santa Rita Durão, Cláudio Manuel da Costa e José Basílio da Gama, e a ilustrada e pré-romântica, com Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e Silva Alvarenga.

Santa Rita Durão foi o autor do épico Caramuru (1781), primeiro poema a tratar dos indígenas brasileiros e seus costumes, embora a partir da  ideologia do catequista e colonizador. Mais propriamente árcade, Cláudio Manuel da Costa oferece nos sonetos neoclássicos de Obras (1768) o melhor lirismo do movimento em terras brasileiras. José Basílio da Gama, que em viagens pela Europa chegou a se filiar à Arcádia de Roma, mostra-se um épico de liberdade às vezes surpreendente em seu Uruguai (1769), que antecipa o indigenismo.

Nascido em Portugal, Tomás Antônio Gonzaga foi o mais famoso dos árcades brasileiros, por sua Marília de Dirceu (1792). Mereceu essa distinção, quer pelas cores locais da lírica desse livro, quer pela virulência das Cartas chilenas, que lhe são atribuídas, pois apresenta em uma e outra obra indícios claros de seu pré-romantismo. Inácio José de Alvarenga Peixoto, carioca, o mais envolvido na Inconfidência, e destroçado por ela, teve suas obras publicadas mais de setenta anos depois da morte, mostrando-se um pré-romântico de traços nativistas. O nativismo impõe-se com sabor popular nos rondós e madrigais de Glaura (1799), de Silva Alvarenga, ainda mais pré-romântico que seus pares.

Na entrada do século XIX, com o final sombrio da Inconfidência e do ciclo do ouro, a vinda da corte portuguesa e tantos motivos de mudança ou de perplexidade, os ideais arcádicos e a poesia de um modo geral empobreceram. Ainda assim, enquanto o romantismo arregimentava suas forças, a influência arcádica deu alguns epígonos fiéis, que mereceram de Manuel Bandeira a inclusão em sua antologia Poesia do Brasil (1963). Foram eles o padre Antônio Pereira de Sousa Caldas e José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência, que ainda nos antigos moldes da escola adotou o nome arcádico de Américo Elísio.

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