As Grandes Navegações e a Descoberta de Nova Terras

As Grandes Navegações e a Descoberta de Nova Terras

As Grandes Navegações e a Descoberta de Nova Terras

Até chegar à exploração do espaço sideral, o homem levou muitos séculos para descobrir e percorrer os caminhos da Terra, muitas vezes encontrando a morte nessa busca, frequentemente apoiada em informações, instrumentos e equipamentos ainda precários.

Dá-se o nome de descobrimentos à expansão marítima europeia do começo do século XV ao fim do XVIII, que resultou no conhecimento da maior parte da África e da Ásia e na revelação de continentes ignorados: as Américas e a Oceania. O intercâmbio comercial com a Índia e a China, já alcançado pela antiguidade clássica, havia retrocedido na Europa medieval, assim como a informação geográfica sobre essas e outras regiões. As Canárias, descobertas por franceses nas primeiras décadas do século XIV, eram as antigas ilhas Afortunadas do mundo greco-romano. E o descobrimento pelos viquingues, no fim do século X, da Groenlândia e da América setentrional ficara esquecido bem antes do desaparecimento, no começo do século XV, da pequena cristandade groenlandesa.

O desejo de expansão teve várias causas: a busca das lendárias riquezas da Índia, da China e do Japão, estimulada pelos relatos de Marco Polo e de viajantes posteriores; a cobiça pelo ouro, o marfim e os escravos africanos; a luta contra o Islã e os anseios de catequizar infiéis e pagãos; e, por fim, a curiosidade científica. No caso específico de Portugal, pesou também o fato de cedo haverem sido cerceadas, pelo crescente poderio de Castela, as possibilidades de expansão territorial da monarquia lusa na península ibérica.

Ao ciclo das navegações atlânticas seguiram-se as que devassaram o Pacífico, tendo em comum a procura de passagem entre os dois oceanos. Daí decorreu a exploração do oceano Ártico, que prosseguiu ainda no século XX. A exploração do oceano Antártico originou-se de longa busca que, ao invés de uma mítica Terra Australis, levou primeiro ao descobrimento dos arquipélagos da Polinésia e da Austrália.

Ciclo atlântico. Até que Colombo levasse Castela a se empenhar na expansão oceânica, o ciclo atlântico foi uma empresa quase exclusivamente portuguesa. Sob o patrocínio do infante D. Henrique o Navegador e dos reis de Portugal a partir de D. João II, em três quartos de século os navegantes lusos redescobriram a ilha da Madeira, ultrapassaram o cabo Não e o Bojador, ambos no noroeste da África, e pacientemente exploraram a costa ocidental desse continente. Ao dobrar o cabo da Boa Esperança, Bartolomeu Dias assegurou a viabilidade do acesso marítimo à Índia pela África, confirmada pelas informações de Pero da Covilhã sobre as rotas da navegação moura entre Sofala, em Moçambique, e aquele país. Contudo, antes de Vasco da Gama, Cristóvão Colombo, tomando como trampolim as Canárias (pertencentes a Castela desde o Tratado de Alcáçovas, em 1479, com Portugal), descobrira ilhas antilhanas na altura onde imaginava estarem as Índias.

A demarcação do papa Alexandre VI em favor dos reis católicos foi alterada pelo Tratado de Tordesilhas, de 1494, diante das reclamações de D. João II, que não queria perder o fruto das navegações anteriores, pois tudo indicava que Colombo encontrara, senão as próprias Índias, pelo menos terras próximas. Isso explica as possíveis viagens pré-cabralinas ao oeste e as de João Caboto que, ao descobrir e explorar extenso litoral da América do Norte, julgou ter chegado a Catai (China). O descobrimento do Brasil por Cabral, precedido em terras americanas por espanhóis (Ojeda, Pinzón) que seguiam as pegadas de Colombo, deve ter sido um reconhecimento de regiões consideradas, pelos portugueses, de pouca importância, uma vez que já conheciam o caminho das Índias. Mesmo assim não deixaram de explorá-las e foram provavelmente os primeiros a alcançar o estuário do rio da Prata. Na América setentrional, João Caboto e Gaspar Corte Real descobriram e exploraram, para Portugal, a costa do Labrador e da Terra Nova.

Por volta de 1520, o navegador português João Álvares Fagundes seguiu a costa, da extremidade da Nova Escócia ao estreito de Canso, margeou a ilha do Cabo Bretão, de oeste para leste, e o sul da Terra Nova até o cabo Race. Parece ter descoberto a ilha de Fundy e mesmo a foz do São Lourenço. Seguiram-se as primeiras tentativas portuguesas de povoamento na América setentrional.

Em meados do século XVI, portugueses e espanhóis haviam fixado, depois de muitas viagens de exploração, as grandes linhas do contorno da América: ao sul, ambas as costas até o estreito de Magalhães; ao norte, a do Atlântico até o Labrador e a do Pacífico até a Califórnia. Mesmo que Drake tenha realmente atingido, no fim do mesmo século, um ponto da costa do atual Oregon, esse extremo só foi ultrapassado no fim do século XVIII, quando James Cook e George Vancouver exploraram o litoral da futura Colúmbia Britânica. Coube aos russos, em prosseguimento a sua secular expansão na Sibéria, patrocinar a descoberta do estreito de Bering e explorar a costa noroeste da América. As feitorias russas estenderam-se do litoral do Alasca ao norte da Califórnia, defrontando-se com o povoamento espanhol. Somente no século XIX a exploração do Ártico e do norte do Canadá permitiu um conhecimento melhor de grande parte da América setentrional.

Passagem entre a América e a Ásia. Antes da expedição de Vasco da Gama (1497-1499), os portugueses já sabiam da primeira viagem de Colombo, mas não se empenharam na busca de uma passagem pelo oeste que os levasse à Índia. Ingleses, espanhóis, franceses e holandeses, verificando o caráter continental da América, procuraram um estreito, mar ou rio que a varasse, conduzindo-os à Ásia. O descobrimento do Pacífico por Vasco Nuñez de Balboa levou os espanhóis a buscarem esse caminho no golfo do México e, depois da viagem de Fernão de Magalhães, no rio da Prata. Receosa de que ingleses e franceses encontrassem a passagem na costa atlântica da América do Norte, em 1524 a Espanha enviou, para descobri-la, o português Estêvão Gomes, que explorou o litoral daquele continente desde a Flórida até a ilha dos Bacalhaus (Labrador).

A conquista do México e do Peru, com o conseqüente desenvolvimento da mineração de metais preciosos, e o fracasso das explorações terrestres de Cabeza de Vaca e Hernando de Soto -- embora percorressem grande parte do interior do continente -- detiveram a expansão da Espanha ao norte da Flórida, a partir de onde Giovanni da Verrazzano, Jacques Cartier e Jean-François Roberval, a serviço da França, prosseguiram na busca da passagem. Verrazzano explorou a costa nordeste da América do Norte, acreditando ter encontrado um mar asiático, erro que a cartografia manteve por mais de meio século. Cartier e Roberval pensaram que o São Lourenço levasse a terras asiáticas ou, pelo menos, a ricos reinos indígenas, como o lendário Saguenay. O fracasso dessas esperanças resultou no abandono do Canadá pela França, até o começo do século XVII. Drake pretendeu encontrar na costa californiana um acesso para o Atlântico, ilusão desfeita apenas no fim do século XVIII por Cook e Vancouver.

Passagem do Noroeste. Já antes da descoberta do Pacífico, Sebastião Caboto, a serviço da Inglaterra, tentou chegar a Catai por um caminho que supunha existir ao noroeste das terras da América setentrional então conhecidas, mas foi detido pelo gelo. No fim do século XVI destacaram-se as viagens dos ingleses Sir Martin Frobisher, John Davis, Henry Hudson e William Baffin, seguidas de muitas outras, até que, em 1850, Robert McClure descobriu no Ártico o estreito que tem seu nome e que somente no começo do século XX foi transposto pelo explorador norueguês Roald Amundsen. A recolonização da Groenlândia ocorreu a partir do século XVIII, por iniciativa da Dinamarca.

Passagem do Nordeste. Em 1553, sob a inspiração de Sebastião Caboto, organizou-se na Inglaterra uma campanha comercial para enviar uma expedição que descobrisse um caminho marítimo do nordeste da Europa até Catai. O porto de Varde, perto do cabo Norte, era então o ponto extremo conhecido no Ocidente. Enquanto os tripulantes de dois navios que haviam alcançado a Nova Zembla pereciam de frio, na costa da Lapônia, Richard Chancellor penetrou no mar Branco e surpreendeu-se ao saber que estava na Rússia. Foi de Arkhangelsk a Moscou e iniciou o comércio da companhia com o czar Ivan III. O holandês Willem Barents, à procura de Chancellor, foi até a ilha de Spitsbergen, invernando em Nova Zembla. Finalmente, em 1878-1879, o sueco Adolf Erik Nordenskjöld conseguiu ir do Atlântico ao Pacífico. Só a partir de 1932 tornou-se possível, com o uso de navios especiais e de quebra-gelos cruzar de uma só vez, durante umas poucas semanas cada ano, o trecho Murmansk-Vladivostok.

Expansão europeia no Extremo Oriente. Uma década após sua chegada à Índia, os portugueses, graças a informações e mapas de navegantes mouros, alcançaram as ilhas das especiarias, onde estabeleceram seu domínio. No século XVI, com base em rotas já conhecidas no Oriente, atingiram a China e o Japão, onde se limitaram a criar entrepostos comerciais. A partir do fim desse século, ingleses e holandeses se apoderaram de quase todo o comércio oriental de Portugal. Em 1663, a Índia portuguesa era um remanescente do império que dominara as rotas das especiarias. Apesar das informações colhidas pelos missionários jesuítas, o nordeste da Ásia permaneceu quase desconhecido na Europa até as viagens de Vitus Bering.

Pacífico Sul e Terra Australis. Depois da viagem de Magalhães, os espanhóis descobriram e colonizaram, a partir de 1521, as Filipinas, a que denominavam ilhas de São Lázaro. Andrés de Urdaneta descobriu a rota que permitia voltar, com ventos favoráveis, de Manila a Acapulco. Os portugueses, no século XVI, à exceção do descobrimento parcial da costa da Nova Guiné (1526), limitaram-se à navegação do arquipélago da Malásia, em busca de especiarias. Os principais arquipélagos do Pacífico sul ficavam fora da rota do México às Filipinas; muitos foram descobertos pelas expedições espanholas saídas de portos do Peru e pelos holandeses e ingleses, vindos pelo estreito de Magalhães ou pelo cabo Horn.

Desde meados do século XVI, procurou-se a Terra Australis, continente que se estenderia do pólo sul aos trópicos. De Magalhães, que nele não acreditou, a Cook, foi essa busca que levou aos descobrimentos mais importantes no Pacífico, induzindo os cartógrafos a interpretarem como pertencentes a essa terra os pontos de desembarque e os sinais registrados, em diversas partes, pelos navegantes. Como os navios a vela não conseguiam enfrentar no Pacífico os ventos do oeste, só podiam explorar o sul do trópico os que viessem naquela direção. O primeiro arquipélago importante descoberto foram as ilhas Salomão, por Álvaro de Mendaña (1567), que saíra de Callao. Em outra viagem, descobriu as Marquesas (1595-1596), e Pedro Fernández de Quirós, seu piloto na segunda viagem, em 1606 descobriu as Novas Hébridas (hoje Vanuatu), que julgou serem o continente buscado, ao qual deu o nome de Australia del Espírito Santo, nela pretendendo fundar a cidade de Nova Jerusalém. Na volta ao México, um dos navios de Quirós, comandado por Torres, seguiu o rumo sudoeste-noroeste, comprovou ser a Nova Guiné uma ilha e atravessou o estreito que a separa da verdadeira Austrália e tem o nome de seu descobridor. A falta de divulgação dessa viagem fez Cook, ao atravessar em 1770 esse litoral, julgar havê-lo descoberto.

No século XVII, holandeses da Companhia das Índias Orientais descobriram por acaso o litoral oeste da Austrália. Continuaram, porém, as confusões cartográficas, que levaram a considerá-la como ilha unida à Nova Guiné, procurando-se alhures a Terra Australis. Abel Tasman, incumbido pela companhia de reconhecer as terras austrais, em busca de ouro ou comércio, bem como de rota mais curta para o Chile, descobriu a costa da Tasmânia (1642), que denominou Terra de Van Diemen, e o litoral oeste da Nova Zelândia, pensando ter chegado ao "continente austral". Costeou grande parte da Nova Holanda (Austrália), sem perceber que era a Terra Australis. Em 1768 Louis-Antoine de Bougainville atravessou o Pacífico, explorando uma área triangular e as ilhas Salomão, cuja localização se perdera, e descobriu Tahiti e Samoa. Cook, em suas três expedições, foi o primeiro a atravessar o círculo antártico. Só ficaram por descobrir alguns arquipélagos polinésios de menor importância. Somente com Matthew Flinders (1802-1803) foi definitivamente conhecido todo o contorno da Austrália.

Consequências dos grandes descobrimentos. A expansão marítima europeia iniciou uma fase de crescente interdependência mundial, em proveito das nações colonizadoras, que dominaram o mundo política, econômica e culturalmente até 1914. Tal hegemonia foi total na América, cuja população indígena, dizimada na maior parte, só sobreviveu na medida em que pôde adaptar-se às novas condições de vida impostas pelos conquistadores. A África negra foi devastada demográfica e culturalmente pelo tráfico negreiro, que forneceu milhões de escravos ao Novo Mundo. A partir do século XVIII e sobretudo no XIX, a Ásia oriental (exceto o Japão) e a Oceania ficaram submetidas aos interesses políticos e econômicos do Ocidente. O Atlântico e o Pacífico predominaram desde então no comércio mundial.

Na Europa, o afluxo do ouro e da prata da América, do século XVI ao XVIII, superou em muito o do ouro africano do século XV e influenciou poderosamente as transformações econômicas, sociais e políticas, das quais a burguesia foi a principal beneficiária. Os produtos tropicais originários do Novo Mundo (algodão e fumo) ou nele introduzidos (açúcar) tornaram-se fonte de riqueza para minorias de colonos europeus e suas respectivas metrópoles, generalizando-se seu consumo na Europa e mesmo em outros continentes, a exemplo do fumo na África e na Ásia. Plantas alimentícias americanas como a batata e o milho melhoraram a dieta popular europeia. Generalizou-se o consumo de especiarias, os produtos de luxo orientais difundiram-se e geraram imitações (porcelana). E a geografia, as ciências biológicas, a história e a etnografia enriqueceram-se enormemente.

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